SÁBADOS, FESTAS E LUA NOVA
Devem os cristãos hoje observar os festivais judaicos?
Que relação têm eles com o descanso do sétimo dia semanal?
(parte 2)
A
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cristãos, incluindo adventistas do sétimo dia, têm argumentado em favor da
celebração dos festivais judaicos mencionados no Antigo Testamento. Mas existem prós e contras. Valorizando as riquezas e bênçãos associadas àqueles
festivais, mas estando atentos aos problemas implícitos na observância deles,
os cristãos podem buscar maneiras apropriadas para se envolver com eles. Essa
prática não apenas deveria ser conduzida com lucidez teológica, mas também com
prudência, equilibrada sabedoria, humildade e boa vontade para aprender. Alguns
itens práticos podem ajudar os cristãos a compreender a implicação dos festivais
levíticos em sua vida e experiência de adoração. Vejamos.
Poderia ou deveria
Primeiramente, é importante compreender o caráter não
normativo dos festivais. O Novo Testamento oferece um bom exemplo de como os
cristãos devem se relacionar com eles. Muitos textos mostram a função tipológica
dos sacrifícios e advertem contra a ideia de que eles ainda são normativos e
necessários para nossa salvação. Por outro lado, em nenhuma parte do Novo
Testamento encontramos que não deveríamos observá-los. Jesus e Seus discípulos o
fizeram; e, posteriormente, os primeiros cristãos seguiram a mesma prática.
Mas, eles nunca sentiram necessidade de forçar os gentios a observar aquelas
festas (At 15).
Sabiamente, eles chegaram à seguinte conclusão: “não
devemos perturbar aqueles que, dentre os gentios, se convertem a Deus, mas lhes
escrever aconselhando-os a se abster das contaminações dos ídolos, bem como das
relações sexuais ilícitas e da carne de animais sufocados com sangue. Porque
Moisés tem, em cada cidade, desde tempos antigos, os que o pregam nas
sinagogas, onde o Pentateuco é lido todos os sábados” (At 15:19-21). O decreto
apostólico se refere a três domínios da lei de Moisés: idolatria, ética e as
leis dietéticas.
Essas prescrições estavam baseadas na leitura dos livros
de Moisés, “todos os sábados”, sugerindo que o respeito ao quarto mandamento também
estava implícito no decreto. Nenhuma referência aos festivais é feita no texto.
Essa atitude contém um princípio de tolerância, não somente em relação aos
gentios, mas também, implicitamente, em relação aos judeus que desejavam se unir
à igreja. Se os apóstolos consideraram impróprio impor aos gentios um novo
estilo de vida que implicava a observância da lei da circuncisão e dos
festivais, também devia ser impróprio impor aos judeus um novo estilo de vida
que implicava o abandono dessas práticas.
A palavra deveria não devia ser usada para impor
nem para defender os festivais. Segundo Ellen G. White, “bom seria que o povo
de Deus da atualidade tivesse uma Festa dos Tabernáculos”. Essa declaração
sugere que ela poderia ter sido favorável a explorar essa possibilidade também para
outras festas. Pois a razão dada para justificar a prática – “uma jubilosa comemoração
das bênçãos de Deus a eles” (Patriarcas e Profetas, p. 540)
– também podia ser aplicada a outros festivais.
Isso mostra não apenas uma atitude de abertura da parte
de Ellen White, mas também de tolerância, sabedoria, humildade e respeito a outro
ponto de vista.
Comemoração
Se escolhermos comemorar a festa segundo o calendário
anual, devemos fazê-lo compreendendo o que a festa significa, da perspectiva adventista
do sétimo dia. É intencional a escolha das minhas palavras aqui – “comemorar”
os festivais em lugar de “guardar” ou “observar”. A comemoração não deve ser
imposta como obrigação doutrinária, litúrgica, religiosa nem administrativa para
a igreja como um todo. Pode ser sugerida como livre oportunidade para lembrar o
plano divino da salvação bem como de nossa identidade e missão proféticas.
Poderia servir como oportunidade para ensinar, aprender e proclamar no lar, na
igreja e no mundo, a grande dimensão do plano da redenção.
Os festivais são nada mais que um instrumento
evangelístico e pedagógico, para ser usado justamente como fazemos ao utilizar
o modelo do santuário para ensinar lições objetivas sobre nossa mensagem. Trata-se
de uma prática descritiva e instrutiva, não prescritiva. Se desejamos comemorar
o festival, deve ser conveniente fazer isso na estação própria, não porque
queiramos ou necessitemos ser fiéis às normas agrícolas, rituais e legalistas,
mas por ser um momento oportuno em que outras pessoas também pensam a respeito;
como no Natal, na Páscoa ou Dia de Ação de Graças (embora essas festas tenham componentes
pagãos).
Entretanto, o principal problema está na maneira pela
qual os festivais poderiam ser comemorados fora da Bíblia, considerando a
ausência de instruções reveladas nesse contexto e de uma tradição de
observância conforme é vista no judaísmo. Para evitar problemas que possam
comprometer todo o projeto, há dois princípios fundamentais que devem governar
e dirigir toda tentativa de comemoração dos festivais.
Respeito à originalidade do lugar de onde a inspiração das festas foi extraída, ou seja, das Escrituras e do
testemunho de Israel. É necessário aprender sobre o genuíno caráter das festas e
sobre as tradições judaicas associadas a elas. Evite enganos e interpretações confusas.
Lembre-se de que as festas não são ocasiões para promoção de ideias e fantasias
pessoais, hobbies que nada têm que ver com elas, tais como danças, aplicações
carismáticas e espiritualistas, ou uso de vestuário exótico. Tais expressões
podem ser entendidas como um jogo disfarçado e comportamento desrespeitoso.
Respeito ao novo lugar para onde a
inspiração das festas tem sido importada, isto é, a igreja. Consulte líderes, para
estar certo de que suas ideias dos festivais e as informações coletadas estão
bem fundamentadas e consistentes com a teologia adventista. Esteja certo de que
a experiência não será mal interpretada, não magoará outros membros e
contribuirá para o bem da igreja. Permaneça humilde e não tente impor sua visão
e prática aos membros da igreja que não partilham de sua perspectiva e
sensibilidade espiritual. Seja prudente em relação aos seus sentimentos,
emoções e convicções sobre esse tema. Não os confunda com a verdade divina ou o
dom do Espírito.
Sim ou não?
Minha resposta à pergunta: “Devíamos nós observar os
festivais?” é um claro e inequívoco “não!” Pelas seguintes razões:
Eles perderam sua qualidade normativa, considerando que
foram cumpridos em Cristo e já não dependem da revelação bíblica. As leis das
festas diferem de outras leis, como o sábado e leis dietéticas, que não estão
relacionadas com sacrifícios, não dependem de tempo e são universais em
caráter. É importante notar que Deus não nos deixou instruções sobre o modo
pelo qual aqueles festivais deveriam ser observados fora do templo. Então, como
poderia Ele requerer a observância dessas leis? Seríamos, então, dependentes apenas
das tradições humanas, fora da revelação bíblica.
A missão e identidade do movimento adventista do sétimo
dia não são definidas como entidades litúrgicas. Em vez disso, a Igreja
Adventista do Sétimo Dia se identifica como mensageira profética com objetivo e
missão universais, transcendendo a variedade de culturas e tradições e
apontando a ordem escatológica.
Por outro lado, esse esclarecimento não deveria excluir
as seguintes opções:
O valor pedagógico de explorar e comunicar as ricas
verdades associadas aos festivais, ou seja, seu significado para o passado,
presente e futuro. Apesar disso, toda a riqueza e beleza das festas não as
transformam em leis normativas a ser seguidas. Elas permanecem exatamente como
instrumento pedagógico.
A comemoração dos festivais pode ser usada para alcançar
os judeus, assim como ocorre com o Natal, Páscoa e Dia de Ação de Graças, no
interesse de alcançar outros grupos culturais religiosos ou seculares.
Entretanto, mesmo nesse ponto, é preciso analisar bem a eficiência e até o
aspecto ético desse método de contextualização evangelística.
Da mesma forma que os
primeiros judeus cristãos, os adventistas judeus não deviam se sentir obrigados
a deixar de desfrutar o prazer dos festivais; e ninguém deve desencorajá-los a
fazer isso. As festas não somente pertencem à herança cultural deles, mas
também lhes possibilitam meios para alcançar outros judeus. À luz das dimensões
profética e teológica da mensagem adventista do sétimo dia, a experiência das
festas pode se tornar para eles ainda mais significativa que no passado.
Entretanto, deve haver clara compreensão de que as leis que ordenam a
observância dessas festas e tradições não são revelações proféticas e já não
são normativas.
Jacques B. Doukhan
Professor no Seminário Teológico da Universidade Andrews, EUA
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